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Foto do escritorDenise Macedo

Arrogância e Solução Final



Arrogância fascistoide. Está na incompetência truculenta do prefeito de São Paulo na cracolândia; na ânsia de vômito do prefeito curitibano Rafael Greca causada pelo cheiro do pobre; na política genocida dos ficcionistas políticos e econômicos no glorioso congresso nacional (sim, iniciais minúsculas). Está nos bolsomitos; na indiferença de cada dia dirigida ao outro.

Para o arrogante, esse outro não deveria existir porque atrapalha e invade seu espaço, aliás, enorme, segundo sua insanidade. Delirante, ele agride e elimina o outro. Em sua mente distorcida, inventa o cenário, trama enredos grotescos e desenha a solução final: livrar-se desse invasor fabular. Argumenta desatinadamente e tapa os ouvidos ao bom senso, pois a verdade não pode contrariar seus desejos infantis e suas atrocidades por motivos vãos. O agressor não quer se vingar de seus inimigos imaginários se for necessário. Quer se vingar de qualquer maneira.

O arrogante costuma ser irado, e a ira desconhece vergonha, decência, honra, laços afetivos. Incida tal ira sobre um pai, este também se torna inimigo, já denunciou a filosofia antiga. O arrogante quer esmagar, desproporcionalmente, o que possa ameaçá-lo, ainda que a ameaça seja apenas uma leve nuvem passageira que se interponha entre esse ser extravagante e o sol. Ele é como o louco Calígula que, irritado com trovões, desafiou Júpiter, um deus, a um combate mortal. Ou como o louco Nero, que mandou matar seu tutor, o sábio Sêneca. Ensandecido e ridículo, o agressor se põe nu.

O próprio Sêneca ensinou que a maldade deve ser eliminada para eliminar a ira, mas o agressor é autoindulgente. Contorcionista moral, julga-se explorado, insultado, injuriado, injustiçado. Mistura cólera com perversidade arraigada e racional e exclui o outro sem remorso porque, para esse delirioso, esse outro não é humano. Os indesejáveis precisam ser desumanizados para o desvairado justificar seus micro-holocaustos. Sua patologia está por trás de políticas da higienização em muitos níveis.

A Neurociência já diagnosticou esse doidivanas: quem tem ou acha que tem poder sofre de uma fragilidade de espelhamento no processo neural. Esse processo é que fundamenta a empatia: ver-se no outro. Essa psicopatia tem nome: Síndrome da Arrogância. Sintomas: desprezo pelo próximo, perda de contato com a realidade, imprudência e incompetência. Está cientificamente provado: o poder, ainda que um poderzinho qualquer, limita a capacidade de percepção do outro. Isso explica muito de nosso cotidiano, e muitos de nós conhecemos alguém assim.

A boa notícia? A síndrome tem cura. A má? O primeiro passo do tratamento é reconhecer a doença, o que é raro diante de um poderzinho que embriaga e em uma sociedade também doente porque lotada de arrogantes. O segundo passo é abrir-se à crítica, mas isso demanda tomada de consciência, que também está em falta. Um remédio para esses soberbos é mantê-los expostos à luz do dia. Foi esse o motivo alegado por Nélson Jahr Garcia para publicar o livreto Minha Luta, de Hitler.

O século 21 também herdou os paranoicos históricos, agentes da exclusão mútua. Se deixá-los a descoberto não funcionar, a alternativa é esperar que os raios de Júpiter atinjam os alvos certos.


Denise Macedo é polemista por vocação,

professora, Doutoranda e Mestre em Linguística,

com pesquisas na área de

Análise de Discurso Crítica

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