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Valentão Covarde

Atualizado: 13 de out. de 2018



Valentão é aquele bambambã dado a intimidações arrogantes. Já tratei aqui e na Carta Capital sobre Arrogância e Solução Final. Modo geral, intimidam os mais fracos. Por isso, não são valentes. E o covarde? Covarde não é só o medroso, mas quem ataca o mais fraco também. Gosto da palavra “podricalho” para ambos. Ambos são desprezíveis. Tenho testemunhado muitos deles em ação por aí.

O valentão covarde é aquele que chuta cachorro morto, que “esmaga o que já caiu” (Ovídio), que faz graveto de pau caído, que não enfrenta coisa alguma. Os ditados populares já o denunciaram. A Filosofia também. Friedrich Riemer disse que o valentão covarde é aquele adversário escondido, sub-reptício. O patife que não tem a coragem de assumir-se a si mesmo; que se esconde atrás da mulher; que quer que os outros se desculpem quando reagem à sua própria covardia, afinal, é um arrogante. Querem reconhecê-lo? Aprendam com Sartre: “Aos verdugos se reconhece sempre. Têm cara de medo”.

Apesar de ser o que é, ou justamente por isso, a covardia está ainda mais na moda. Está sendo capitalizada porque é o assunto do dia, da mídia; vira concorrência pela notícia em primeira mão, vira plataforma política. Covardes mais comuns têm admiradores do tipo cães fiéis. Apologistas da pena de morte, da redução da maioridade penal, do fechamento das fronteiras e da tortura têm voto. Por que tantos se espelham no valentão covarde? Júlio Cortázar traz uma possível explicação: ser valentão é muito mais fácil do que ser homem.

A violência já ganhou ares de normalidade ou de espetáculo, e nós vamos transitando entre o revide, que nos tornaria igualmente bárbaros; a denúncia, porque o silêncio não cabe; ou o apelo à justiça, que pode tardar e falhar. Por que o silêncio não cabe? Quem explica é Martin Luther King Jr.: a covardia quer a segurança, o comodismo quer a popularidade, a etiqueta quer a elegância, mas a consciência quer o que é correto. “Chega uma altura em que temos que tomar uma posição que não é segura, não é popular, não é elegante, mas temos que fazê-lo porque a nossa consciência nos diz que é essa a atitude correta”.

Poderia citar muitos outros contrários ao silêncio. Robert Anthony disse: “O contrário da valentia não é a covardia, mas o conformismo”. Quem preferir, faça-se acompanhar de Albert Einstein: “O mundo é um lugar perigoso de se viver, não por causa daqueles que fazem o mal, mas, sim, por causa daqueles que observam e deixam o mal acontecer”. Outra opção é Abraham Lincoln: “Pecar pelo silêncio, quando se deveria protestar, transforma homens em covardes”.

Foi Goethe, porém, quem denunciou a condição desse podricalho: “O covarde só ataca quando está a salvo”. Ele está a salvo atrás da porta de sua casa, atrás da ligação telefônica, atrás de um revólver, atrás da distância do mundo virtual, atrás de instituições, tocaiando atrás de uma pilastra. Mas ele está a salvo também atrás do nosso silêncio e da nossa própria covardia, refestelando-se no raso prazer de descarregar sua ira sem sofrer retaliações. O consolo vem de Erasmo de Rotterdam: um valentão ainda encontra outro mais valente que ele.


Denise Macedo é polemista por vocação,

professora, Doutoranda e Mestre em Linguística,

com pesquisas na área de

Análise de Discurso Crítica

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