
Considerando o caminho já percorrido e os novos que se abrem ao exercício do papel de revisor nas sociedades contemporâneas, muitas perguntas são pertinentes: quem é o revisor hoje? Quais os limites entre as funções dos profissionais envolvidos na produção de materiais de leitura? Quais interferências do revisor são defensáveis? O que os autores esperam do revisor? São perguntas antigas e cujas respostas não são consensuais, e outras já começam a surgir.
Uma obra literária ilustra as discussões sobre os limites do revisor: História do Cerco de Lisboa, de José Saramago (1989). Nela, um autor, cuja obra está nas mãos de Raimundo Silva, revisor, conta a este o apólogo de Apeles – o artista – e do sapateiro:
– O sapateiro, mero operário especialista em calçados, apontara um erro na sandália pintada por Apeles em uma tela. Verificando que o artista emendara o desacerto, aventurou-se a dar opiniões sobre a anatomia do joelho. Apeles, furioso com o impertinente especialista em sandálias, disse-lhe: "Não suba o sapateiro acima da chinela." Frase histórica. Ninguém gosta que lhe olhem por cima do muro do quintal.
– Talvez, mas só enquanto não viesse examinar a pintura um sábio anatomista.
– Tem sentido muitas tentações de sapateiro na revisão do meu livro.
– A idade traz-nos uma coisa boa que é uma coisa má, acalma-nos, e as tentações, mesmo quando são imperiosas, tornam-se menos urgentes.
– Por outras palavras, vê o defeito da chinela, mas cala-se.
– Não, o que eu deixo passar é o erro do joelho.
Revisão de Texto demanda ainda muitas reflexões sobre suas práticas e objetivos.
Essa série está genial. Inteligente e instigante. Parabéns.