Um pseudopresidente esperto, que finge não conhecer a antiga relação entre universidade e Estado, ou um presidente intelectualmente limitado, como insiste em se mostrar? Ou ambos?
Sua incapacidade de articulação mínima do discurso e do pensamento mostra o quanto desconhece ou finge desconhecer que as universidades nascem para servir aos interesses das classes dominantes. Não chega perto de imaginar a definição althusseriana de universidades como aparelhos ideológicos do Estado, espaços de produção de saberes fundamentais para o regime capitalista e de materialização da ideologia neoliberal.
Não por outro motivo, o destino vanguardista da jovem Universidade de Brasília foi interrompido pelo golpe militar de 1964 e volta a ser ceifado pelo golpe temeroso de 2016 com um teto de 20 anos. Ela não chegou a materializar o sonho darciniano de ser um espaço de luta contra o subdesenvolvimento e a dependência da América Latina. Darcy Ribeiro esperava que alunos/as fossem preparados/as para protagonizarem a construção de uma sociedade sem desigualdades sociais; para pensar o Brasil, periferia capitalista, como problema. 58 anos depois, UnB e outras universidades estão longe de formar esses cidadãos, menos ainda, militantes políticos.
Divididas em lutas parciais, padecem da fragmentação de docentes, de departamentos, de recursos. Estão longe de gerar ciência e conhecimento que levem a população ao bom viver e ao bom governo. Estão longe ter cunho nacionalista; de se voltarem para os grandes problemas da nação e prepararem o/a aluno/a não apenas para o mercado, mas para incidir no mercado, sem exportar seus cérebros. Estão longe de ter natureza descolonizadora, privilegiando nosso conhecimento original para além dos cânones brancos europeus ou estadunidenses. Estão longe de superar agências de fomento, que se subordinam ao Banco Mundial, que, por sua vez, atende aos interesses do capitalismo internacional.
Um rápida volta pelos longos corredores da UnB, onde ele nunca esteve, seria suficiente para mostrar ao senhor das armas que as universidades permanecem como sempre foram. Na década de 1960, seguiram os impulsos militares e as forças estrangeiras. Na década de 1970, formavam trabalhadores do conhecimento no centro das economias pós-industriais porque o crescimento das nações passou a depender mais da produção e da aplicação desse conhecimento, aproximando a educação da função econômica, da competição e da visão empresarial de cidadania. Esses ecos empresariais se fizeram ouvir nas universidades nas décadas de 1980 e 1990, culminando na universidade gerencial. Os anos 2000 preservaram o caráter privatizante das políticas educacionais.
Bolsonaro desconhece a relação entre universidade e Estado, ou, ao contrário, mantém o antigo discurso senso comum de um jogo elitista sujo que pretende justificar o ataque à academia, de tempos em tempos, para manter o status quo? Embora as universidades sejam o espaço privilegiado, ao menos como potência, da resistência, o cenário ultraneoliberal que o novo governo representa mostra que o senhor das armas pode ficar tranquilo. Se as universidades formassem os militantes que o mito e seus seguidores tanto temem, ele não teria sido eleito.
Análise perfeita. Preciso ler sua tese, está tudo lá.