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As Crianças Não Têm Culpa


A Infância dos Desvalidos
Imagem de Newton Scheufler - A Infância dos Desvalidos

Incuráveis tiranos, disse Roger Waters em São Paulo. Falava de Trump, de Le Pen, de Putin, de Orban, de Bolsonaro. O criador de Another Brick in the Wall, crítico contundente de rígidos sistemas educacionais, antifascista, anticapitalista, colocou uma dúzia de crianças da periferia paulistana no palco. Vestindo macacões laranjas de presidiário, elas marcharam ao som das letras de combate à militarização. Depois, vestiram camisetas com um grande RESIST. No céu, o porco rosa: Respeitem as mulheres; No Wall; As crianças não têm culpa.


Nazismo e fascismo interromperam muitas infâncias na Alemanha e na Itália das décadas de 1930 e de 1940. Na França da mesma época, reacionarismos ceifaram o nascimento da pedagogia popular. No Brasil pós-golpe 2016, pediram menos Paulo Freire. Pouco ecoa, lá e cá, ontem e hoje, o ideal de uma sociedade em que a criança possa desabrochar o mais humana e harmoniosamente possível.


A educação virou mercado; a infância virou produto. Outros incuráveis tiranos - pais, mães, avós, professores, padres, especialistas - garantem que as crianças copiem, esperem, obedeçam, imitem, controlem-se, tolerem, respeitem, corram à disney. Repeat after me! Compram presentes e tentam comprar o afeto infantil no Dia das Crianças, mas desprezam a história e a cultura do próprio país, que poderiam ensinar a elas.


A criança já institucionalizada de Waters pergunta: Papai, o que mais você deixou para mim? Em suma, era apenas um tijolo na parede. Os tiranos negociam: If you don't eat your meat, you can't have any pudding.


Porque já pediram menos Paulo Freire; porque já golpearam "por meus filhos e por meus netos"; porque Roger Waters enfrentou bolsominions e foi aplaudido, mas foi vaiado também; porque os adultos não são admiráveis, deixem as crianças em paz. Respeitem o tempo que elas têm de escutar, de dizer, de perguntar, de entender. O tempo delas é cheio de esperança, de expectativas, de delicadeza e de possibilidade. Malaguzzi já disse: "As crianças escutam a vida em todas as suas formas e cores, e escutam os outros." Escutem-nas.

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